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Guitarras “Lawsuit”: Verdade X Lenda Urbana

“Essa guitarra é uma Lawsuit”

“Então mano, essa guitarra que estou vendendo é uma Lawsuit!”

“Fulano, compra essa guitarra que é uma Lawsuit!”

Hoje em dia, o que mais vemos no mercado de guitarras japonesas vintage é a palavra “Lawsuit”. Pode olhar os anúncios no eBay por exemplo ou ainda no Reverb e vais achar um monte de vendedores anunciando suas copias de Gibson ou até mesmo de Fender (!) como sendo guitarras Lawsuit! Isso, no mercado, chamamos de “hype” e claramente certos vendedores usam este argumento para vender suas guitarras num preço acima de seu verdadeiro valor. Neste artigo, vamos esclarecer esta questão, desmistificando o argumento “Lawsuit” para que você não seja feito de trouxa na hora de comprar sua guitarra Made in Japan!

O que significa “Lawsuit”?

A palavra Lawsuit significa em inglês “ação judicial”, ou seja quando duas partes se enfrentam no tribunal porque uma delas afirma ter sofrido algum tipo de prejuízo.

No caso que nos interessa aqui, vemos comumente pessoas se referindo a guitarras Lawsuit quando se trata de guitarras vintage japonesas produzidas nas décadas de 70, 80 ou até mesmo de 90. Mas será que isto procede?

As origens -Harry Rosenbloom, Elger Guitars, Hoshino Gakki, Ibanez

Em 1954, Harry Rosenbloom abriu uma loja de musica chamada Medley Music em Bryn Mawr, Estado da Pensilvânia, ao noroeste de Filadélfia. Nesses tempos que seguiram a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos conheceram um período farto para o mercado de instrumentos musicais e as guitarras se tornaram muito populares. O Sr. Rosenbloom encontrava então problemas para adquirir produtos novos devido a forte demanda. Por exemplo, o tempo de espera para comprar violões da Martin era de 3 anos!

Foi nesse contexto que o Sr. Rosenbloom decidiu montar sua própria fábrica de guitarras para assim resolver seus problemas de estoque. A fábrica da Martin ficava na cidade de Nazareth, Pensilvânia, a cerca de 115km de sua loja, e o Sr. Rosenbloom queria fazer instrumentos de melhor qualidade. Foi assim que ele criou uma nova empresa chamada Elger Guitars, cujo nome é a junção da primeira silaba dos nomes de seus filhos Ellen e Gerson. Em 1959, ele fabricou ele mesmo seus primeiros instrumentos mas logo percebeu que lhe seria impossível satisfazer a demanda trabalhando sozinho. Ele então contratou um luthier alemão chamado Karl Muller que, junto com seu irmão Georg formou uma pequena equipe de produção. Eles elaboraram o design de novas guitarras e eles mesmos as produziram num ateliê situado em Ardmore, na Pensilvânia. Os irmãos fabricaram guitarras de alto padrão para a Elder Guitars até 1964.

Foi em 1964/65 que Rosenbloom decidiu pôr um fim a produção de guitarras handmade para privilegiar a importação de instrumentos. Com muita visão comercial para a época, a Elger Guitars tornou-se a distribuidora da Hoshino Gakki Gen Company, fábrica japonesa de instrumentos musicais.

Na década de 60, os produtos Made in Japan não tinham boa reputação, assim como produtos chineses ou coreanos hoje em dia… Foi muito provavelmente por esta razão que Rosenbloom quis importar instrumentos cuja marca não tinha nome com consonância japonesa. Hoshino Gakki acabava de adquirir uma pequena empresa espanhola chamada Ibanez e pretendia guardar esse nome. Um fato bem interessante é que as ultimas guitarras Elger (de 1965 até 1970) foram todas Made in Japan e muito parecidas com as Ibanez que seriam produzidas nos anos 70.

Hoshino Gakki acabou comprando a Elger Guitars em 1971 e assim ganhou os direitos de importação e distribuição dos instrumentos nos Estados Unidos. Foi então que a Elger Guitars foi rebatizada em Ibanez USA.

Quando entrou no mercado americano, Ibanez ainda era uma empresa desconhecida. Logo, a marca viria a se expandir nos anos 70 graças às copias de guitarras de marcas famosas como Fender, Gibson e Rickenbacker.  O trabalho da Ibanez era bom, as copias eram relativamente fieis. O sucesso da marca era devido a mão de obra e matérias primas mais baratas que nos Estados Unidos, assim como uma melhor automação dos processos de produções que existiam então no Japão. Até hoje, podemos verificar que estes fatores permitem dominar boa parte do mercado. Se uma copia for bem feita, sempre haverá compradores.

No entanto, devemos lembrar que as copias de guitarras Made in Japan mais antigas não eram totalmente fieis as originais, muitas eram feitas a partir de fotos dos artistas ou de catálogos. Os braços eram parafusados e não colados (até 1976-77), os corpos eram do tipo “pancake” e o topo feito de compensado (geralmente de White Sycamore). Contudo, Ibanez ficou popular porque jovens artistas americanos compravam seus modelos mais baratos que as originais (ex: Eddie Van Halen, Ace Frehley, Chris Holmes e muitos outros) e a qualidade era boa.

O processo “Gibson contra Ibanez”

Foi no dia 9 de junho de 1977 que a Norlin, empresa-mãe da Gibson, iniciou um processo contra Elger, ou seja Ibanez, na cidade de Filadélfia. No caso conhecido como “Gibson Vs. Elger Co.”, Gibson alegou uma violação de marca registrada por causa das copias feitas por Ibanez do formato de seu headstock (cabeçote) do tipo “Open Book” ou “Moustache”. Na realidade, já fazia tempo que Gibson ameaçava Ibanez de processo por violação de direitos sobre o headstock.

Gibson vs Ibanez - Lawsuit Guitars

Então não é a toa que Ibanez já tinha mudado o formato de seu headstock antes mesmo do processo, ou seja no final de 1975. Podem conferir os catálogos Ibanez Guitars disponíveis neste site para perceber que o design do headstock já é diferente nos produtos ofertados em 1976. A partir daquele ano, o headstock adotou um formato do tipo Guild Guitars.

Gibson (Norlin) teria tentado, pela mesma ocasião, prejudicar Ibanez durante o NAMM Show de 1977, deixando a marca japonesa com box vazio pois não poderia expor seus instrumentos com o headstock em formato de Open Book. No entanto, Ibanez havia antecipado o problema e conseguiu divulgar suas guitarras e baixos com o novo design de headstock do tipo Guild.

Portanto, as historias que consistem em afirmar que Gibson (Norlin) processou diversas marcas de guitarras japonesas são totalmente falsas e não passam de lendas.

Ibanez Lawsuit Guitar Headstock Story

Essa mudança do headstock aconteceu logo depois que Ibanez introduziu números de serie nos seus instrumentos. Existe poucos exemplares de Ibanez “Lawsuit” com serial de Novembro e Dezembro de 1975, mas a maior parte das “Lawsuit” não possuem, de fato, nenhum tipo de serial.

Em Fevereiro de 1978, Ibanez parou de fazer copias de guitarras famosas e começou a produzir suas guitarras com próprio design. Foi quando a marca lançou as Artist Series e o modelo Iceman que ficou famoso nas mãos de Paul Stanley do Kiss já que virou sua guitarra assinatura (Paul Stanley Iceman). Nesta época, Ibanez produziu guitarras de alta qualidade, tão boas quanto as Gibson no que diz respeito a construção e acabamento.

Então é isso amigo, se chegou até o final deste artigo, você entendeu que tem que tomar cuidado com as guitarras que recebem o rotulo de “Lawsuit”. Não acredite nos vendedores que usam este apelido nos seus anúncios só para elevar o preço de seus instrumentos e fazer de trouxa o iniciante que quer simplesmente adquirir uma guitarra japonesa vintage de qualidade.

Algumas informações contidas neste artigo foram encontradas no site GuitarAttack

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Comentários :

4 Responses

  1. Eu tenho uma Ibanez lawsuit dessas, provavelmente de 1976. Mas ela é uma Telecaster com braço e head de les paul igual ao da foto similar às Guilds. Todas as peças são originais do corpo e braço. É muito bonita. Seus captadores são de alnico.

  2. Amigo, então uma Ibanez lawsuit com headstock “open book” 1978 é falsa? Tenho acompanhado o mercado brasileiro e não encontrei Ibanez com número de série, ou anterior a 1976, de fato.
    Uma pena ter tanto picareta tentando extorquir os poucos reais que nada valem dos músicos amadores do Brasil.
    Obrigado pelas informações!

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